Após investidores institucionais procurarem a B3 buscando explicações sobre o direito dos acionistas detentores de ações preferenciais de empresas listadas no Nível 2, um dos segmentos de governança corporativa da bolsa brasileira, a regra, que já estava no papel, foi reiterada. Em caso de convocação de assembleia geral extraordinária de acionistas de companhias listadas no Nível 2 para tratar, por exemplo, de uma incorporação, votam todos os acionistas, de maneira equitativa, sejam eles titulares de ações ordinárias ou preferenciais.
O dever de tratar sobre as regras do Nível 2, apareceu quando a controladora da AES Tietê – listada nesse segmento -, a AES Corp relatou que conhecia o direito de voto da ação preferencial no âmbito da proposta de incorporação realizada pela Evena, mas que não aturaria que um direito “limitado” pudesse afastar a vontade daqueles que possuem direito a voto.
A B3 em seu comunicado aponta que o caso abrangendo a investida de incorporação da AES Tietê pela Eneva, e comenta que a inserção do direito de voto ao preferencialista nas empresas listadas no Nível 2, aconteceu em alguns momentos para “garantir representatividade ao acionista minoritário em assuntos de grande relevância na vida da companhia”.
Ao se colocar em oposição ao direito dos preferencialistas votarem, a AES Tietê alegou que se uma transação desse tamanho – de R$ 6,6 bilhões – pudesse ser decidida sem a anuência dos detentores de ações ordinárias, haveria uma inversão da estrutura societária das companhias brasileiras, o que poderia colocar todas as companhias listadas no Nível 2 em “clara instabilidade e sujeitas a ofertas hostis”.
Porém, a B3 rebate que esse direito dá, de maneira automática, aos preferencialistas a prerrogativa de definir o desfecho de decisões relevantes, tal qual uma incorporação. Isso porque isso depende dos diferentes arranjos societários. “Em um número significativo de companhias listadas no Nível 2, o acionista controlador administra sua estrutura de capital mantendo, para si, um número de ações ordinárias e preferenciais que, somadas, garantem-lhe mais de 50% de participação no capital social”, de acordo com o documento da B3, enviado ao mercado. Desta forma, a empresa com essa estrutura de capital terá sua vontade prevalecendo, seja porque possui sozinho mais da metade do capital social, seja porque os minoritários, titulares de ações ordinárias e preferenciais, não são capazes ou não possuem interesse de se mobilizar para se colocarem contra.
Entenda melhor o caso
A AES Corp, por exemplo, possui mais de 60% das ações com direito a voto da Tietê. No entanto, se considerar o capital total, sua parcela cai para 24%. Ou seja, se os preferencialistas quisessem, poderiam decidir pela incorporação da Eneva. A AES perdeu a maioria do capital total da companhia por conta de reestruturações societárias ao longo dos anos, principalmente envolvendo empréstimos com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), sendo um deles envolvendo a Brasiliana. Nesse processo, o empréstimo do BNDES, que foi feito via debêntures conversíveis em ações, acabou se transformando em uma participação do banco de fomento na companhia. Foi nesse processo, inclusive, que a AES Corp teve seu capital diluído. O BNDES é hoje o maior acionista minoritário na AES Tietê.
Quando foram criados os segmentos de listagens foi definido colocar voto para todos os acionistas em alguns casos, como em uma incorporação, para evitar que detentores de 50% uma ação ordinária, o que poderia ser o correspondente a apenas 17% do capital total da empresa, pudesse definir o negócio. Assim, decidiu-se incorporar nas regras do Nível 2 que em alguns assuntos a maioria deveria decidir.
“Na visão da B3, o direito de voto dos preferencialistas previsto no regulamento do Nível 2, visa à garantia de representatividade do acionista minoritário em assuntos de grande relevância para a companhia, não tendo sido concebido exclusivamente para conferir, à maioria do capital social, possibilidade de veto em reorganizações societárias envolvendo potencial abuso do poder de controle exercido pelo titular da maioria das ações ordinárias”, conforme a B3.
Fonte: Estadão