O cenário atual da economia no país coloca 2020 com potencial de ser pior nos últimos dez anos para os negócios de fusões e aquisições (M&A). Trabalhando de maneira remota devido ao isolamento social, advogados estão atolados de questões contratuais – a maior demanda vinda de companhias do Brasil inteiro.

Empresas que estão com negociações praticamente fechadas, estão fazendo consultas e analisando uma possível renegociação dos contratos e em muitos casos, até mesmo considerando encerrar a operação, o que é muitas vezes a decisão mais lucida em vista dos efeitos causados pela crise. O estudo está sendo realizado com base em uma cláusula conhecida dos contratos de M&A, denominada de MAC (Material Adverse Change).

Porém, o tema fica aberto a compreensão e umas das saídas tem sido negociar para que a efetivação das transações passem para o segundo semestre de 2020, no momento em que se prevê uma maior visibilidade sobre as condições econômicas das companhias.

Este item que sempre consta nos contratos de M&A, preserva compradores e vendedores de uma transação coagida quando ocorre um fato que é capaz de modificar de forma extrema às condições iniciais sobre as quais os contratos foram pensados. Ana Frazão, sócia do escritório Ana Frazão Advogados, explica que: “Nessa cláusula as partes alocam as suas próprias percepções de risco em relação ao negócio e que consideram importante e se evitar ir à regra geral do código civil”.

Vale lembrar que no código estão pressupostos os casos fortuito ou de força maior. Na lei consta a seguinte afirmação “devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver eles responsabilizado”.

Carlos Portugal Gouvea, sócio do escritório PGLaw e professor na Universidade de São Paulo (USP), comenta que a existência desse parágrafo serve para oferecer mais tranquilidade durante à operação, que em muitos casos pode ser demorada devido a necessidade de aprovação de órgãos reguladores.

De acordo com Gouvea, a cláusula MAC é ponto em que os envolvidos em uma transação de M&A já estão acostumados a depositar mais tempo. Por hora, um dos temas centrais nas mesas redondas é ligado ao “valuation” das empresas perante o atual momento que atravessa a economia.

Ele também conta que durante uma pandemia que aconteceu em 2003 em Hong Kong, essa questão foi muito discutida nos contratos de fusão e aquisição. “Esse assunto foi muito debatido naquele momento. Umas das coisas que tem que ser levada em consideração são se ações governamentais, como o ‘lockdown’, afetaram o negócio da empresa”.

Miguel Neto, sócio do escritório Miguel Neto Associados, comenta que nesse momento em que já ocorreu a assinatura, mas que a transação ainda não foi finalizada de fato, existem clientes considerando a pedindo detalhes sobre a possibilidade de aplicar a cláusula MAC, em busca de obter um adiamento.

Futuro

No escritório Stocche Forbes, localizado em São Paulo, existem transação que seguem acontecendo de forma remota. Porém, para os contratos que já foram firmados, o conselho tem sido para esperar concluir a transação em período de mais visibilidade. O sócio do escritório, Flávio Meyer, fala que: “uma das dúvidas mais frequentes que tem chegado, vem da ponta compradora nas operações, que começaram a questionar sobre a saúde financeira da empresa a ser comprada neste momento e se a cláusula de força maior poderia ser acionada”.

Para ele, o melhor a se fazer e esperar por um período que proporcione mais visibilidade. Até porque é necessário ter cuidado para não levar o contrato lado o contencioso.

“O mercado de fusões e aquisições pode mais a frente ter algum aquecimento por conta da necessidade de empresas venderem ativos, por exemplo, já que podem precisas de liquidez”, salienta Meyer.

Outro advogado consultado, Francisco Costa e Silva, sócio do Bocater Advogados, fala que o encerramento dos contratos deve ser objeto de arbitragens, já que as empresas buscam mesmo é preservar seu caixa.

A especialista em Fusões e Aquisições do Cescon Barrieu Advogados, Fernanda Bastos, alerta que acionar tais cláusulas para desfazer a transação é algo que abre margem para diferentes interpretações. Desta forma, é preciso prever quais situações referentes à crise podem ser aptas para desfazer o negócio.

Segundo a Bastos, é fundamental observar o cenário. “É preciso analisar quais situações da crise devem ser consideradas aptas para que um negócio seja desfeito. É necessário definir quais aspectos podem ser estabelecidos como alteração significativa”.

É fundamental que as decisões tomadas sejam bem analisadas para que no fim, prevaleça o conforto e segurança de todos os envolvidos na transação.

Fonte: Estadão